24 agosto 2019

Cafezinho na Bahia: a pausa que aquece ainda mais nossos calorosos corações.

 
Quem pensa que pelo fato de vivermos numa ensolarada urbe nós, soteropolitanos, não somos chegados a uma rubiácea quentinha, em muito se engana. Apreciamos, apreciamos e muito, seja dia, seja noite, brasileiros somos. Só que ao invés de sorvermos o cafezinho nosso de cada dia em balcões de bares ou padarias apinhadas de gentes, como sói acontecer em São Paulo e no Rio de Janeiro, preferimos fazê-lo ao ar livre aproveitando uma boa brisa vinda do mar do Atlântico que fica logo ali na esquina. Nós não vamos ao cafezinho - que aqui chamamos carinhosamente de menor ou menorzinho, sendo que o sem leite é singelamente batizado de pretinho. Aonde quer que estivermos, ele é que chega até nós em simpaticíssimos carrinhos de café, coisa da criatividade do proletariado soteropolitano que bolou e que fabrica os tais transportadores do quente e oloroso café acondicionado em diversas garrafas térmicas que nesta afrocity chamamos de quente-frio. E lá se vão pelas ruas, ladeiras, altos, baixos, alamedas, vielas e becos de Soterópolis os carrinhos empurrados pelos seus orgulhosos donos, e é aquele desfile de matar de inveja os imponentes carros alegóricos das escolas de samba do Rio de Janeiro e de Sampa, sendo cada carrinho de café personalizado pelo seu justificadamente orgulhoso proprietário. Este vendedor, aliás, aqui batizamos de café ou cafezinho e assim, respeitosamente, o chamamos quando queremos sorver um revigorante menor. Aliás cada um deles com suas características próprias segundo o gosto estético do envaidecido dono que o vai enfeitando dia a dia. Vale escudo do EC Bahia ou do EC Vitória, adesivos diversos, luzes e o escambau, e aí fica um mais bonito que o outro - alguns até são dotados de som em altura moderada - e neles se vendem ainda cigarros para os incorrigíveis e assaz contumazes, inveterados e renitentes tabagistas. Neles  também se mercam os tradicionais queimados, que é como nós baianos simpáticos e cheios de malemolência, batizamos o que em outros rincões desta vasta Pindorama chamam de balas. Balas para nós são só aquelas que malfeitores, sicários, milicianos e policiais, fartamente e a qualquer hora, despejam pelos espaços urbanos, cada um do seu lado e nós, cidadãos comuns, no meio tentando se esconder e apelando a um dos muitos santos que tradicionalmente são escalados para prestar tais protetores serviços entre nós. Mas enquanto essa galera do mal não vem nos apoquentar, ficamos ali na boa, olhando o mar azulzinho, curtindo uma brisa que nos mitiga a alma e sorvendo com vagar o mais delicioso dos cafezinhos que há neste orbe. Para melhor dar uma ideia do que dito foi, não perdi tempo e esta cena genuinamente soteropolitana aí acima eu fotografei com minha Rolleyflex de tinta acrílica, depois usei um tostão de Photoshop, enquanto bebericava um menorzinho vindo de um quente-frio do carrinho de um cafezinho que passava assobiando sob minha janela.
(25/04/14)